Rede do bem

Distante 206 quilômetros de Palmas (TO), o município de Pedro Afonso vive uma fase de pleno desenvolvimento. Com apenas 13 mil habitantes, essa pequena comunidade vive avanços consideráveis nas áreas de educação, meio ambiente e agricultura. E quando perguntamos a qualquer morador o segredo dessa boa fase, a resposta é certeira: é tudo fruto da cooperação.

Conhecida como a capital da soja no Tocantins, Pedro Afonso viu o progresso chegar juntamente com três cooperativas : a Cooperativa Agroindustrial de Tocantins (Coapa), a Cooperativa Educacional de Pedro Afonso (Coed) e o Sistema de Crédito Cooperativo (Sicredi),

Esses empreendimentos trouxeram mais movimento, emprego e desenvolvimento para toda a região, e não somente para Pedro Afonso. Desde a chegada do cooperativismo, notamos que cidade se uniu e há mais amizade”, destaca Divina Mendes, 68 anos, cooperada da Coapa — primeira cooperativa a impactar a comunidade.

Criada há exatos 20 anos por um grupo de pequenos produtores rurais, a Coapa ajudou a alavancar a produção agrícola da região, oferecendo  apoio técnico, infraestrutura para armazenagem de grãos, além de núcleos de participação focados em dois públicos até então carentes de atenção: os jovens e as mulheres.

A inclusão e o empoderamento desses dois públicos foram fundamentais para o desenvolvimento da comunidade”, reconhece Divina. “Graças à cooperativa, passamos a participar da vida social e profissional da cidade e, agora, desenvolvemos trabalhos para melhorarmos a renda familiar. No grupo de mulheres, fazemos polpas de frutas, doces em compotas, chocolates, biscoitos, licores, paçocas e vendemos na feira”.

Além da Coapa, outras duas cooperativas se instalaram em Pedro Afonso: a Coed, de ensino, e o Sicredi, do ramo crédito. O trio decidiu viver, na prática, o princípio da intercooperação, desenvolvendo programas e ações em conjunto para beneficiar a comunidade. “É uma verdadeira rede do bem”, explica Ricardo Khouri, presidente da Coapa.

Trabalhamos unidos para promover o desenvolvimento e a alavancagem da região. Além disso, por sermos cooperativistas, temos o compromisso de deixar os recursos gerados por nossas atividades aqui mesmo, na cidade, gerando emprego, renda e oportunidade para muitas pessoas”.


PONTE PARA O FUTURO

Crédito: Lula Lopes

Assim como em centenas de municípios brasileiros, em Pedro Afonso as pessoas descobrem o poder da cooperação desde muito cedo.  Praticamente todos os moradores da cidade são associados a uma cooperativa ou pelo menos estão sendo beneficiados por elas. É comum casais conversarem sobre o dia na cooperativa, trocando ideias sobre como fazê-la crescer ou comemorando os resultados alcançados. Com isso, as crianças aprendem que o cooperativismo é bom, traz comida para a mesa e alegria para toda a família.

Na escola não é diferente. Especialmente na Cooperativa Educacional de Pedro Afonso (Coed), que educa os estudantes da região desde o maternal até o nono ano do ensino fundamental. “Trabalhamos o cooperativismo com todos os nossos alunos. Temos uma disciplina em que ensinamos a cooperar, a dividir, e acreditamos nesse formato de educação. Um aluno com essa base será um adulto melhor. Não estamos somente preocupados com o lado educacional, mas também com os valores e os princípios que esses estudantes levarão para a vida adulta”,  explicou a diretora-presidente da cooperativa, Gleide Azevedo.

Ainda de acordo com Gleide, as crianças e jovens de Pedro Afonso exergam nas cooperativas um mundo melhor, uma oportunidade de emprego e uma ponte para um futuro melhor. Além disso, em sala de aula, também aprendem a administrar o próprio dinheiro e a poupar, graças ao apoio de projetos educacionais do Sicredi.  

A atuação conjunta da Coed, da Coapa e do Sicredi é fundamental para Pedro Afonso”, elogia Gleide. “Somos três cooperativas, trabalhamos o bem comum da comunidade e almejamos o crescimento pessoal e do município. Essa integração entre as cooperativas facilita o nosso trabalho e a vida de todos”.

A coordenadora do núcleo feminino da unidade Sicredi de Pedro Afonso, Maria Ivanete Maciel, 47 anos, concorda com a colega da Coed e acrescenta: a intercooperação mudou a história do município e alavancou o crescimento da região, inclusive aumentando a oferta de postos de trabalho.

Quando juntamos nossas cooperativas, a população notou que tudo melhorou e se sentiu mais feliz, porque soube que tem o nosso apoio. A vida de Pedro Afonso mudou, pois agora tem mais oferta de empregos e facilidades para a população”, exemplificou Ivanete.

A satisfação dos moradores e a melhora da qualidade de vida proporcionada pelo cooperativismo são facilmente traduzidas no município  pelo Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) <abre hiperlink para site de IDH>, captado pelo Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil. A taxa aferida na região supera a média brasileira, atingindo 0,732 pontos— em uma escala de zero a um, na qual quanto mais próximo de um, maior o desenvolvimento da região.

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MUDANDO VIDAS, REALIZANDO SONHOS

Crédito: Lula Lopes

A intercooperação realizada em Pedro Afonso já ultrapassou as fronteiras do estado e do Brasil. Um dos projetos apoiados pelas três cooperativas da cidade está levando os jovens da cidade para conhecer outras cidades brasileiras e, em breve, outros países. Trata-se do projeto Amigos do Meio Ambiente (Ama), criado pelo professor Fabrício Rocha, 35 anos, em 2010.

Historiador, enfermeiro e pedagogo, Rocha entendeu que um bom educador  pode contribuir com o desenvolvimento da comunidade também fora dos muros da escola. “Decidi  contribuir com a preservação do meio ambiente para mostrar aos alunos que é possível transformar o mundo com atitudes simples, como dar a correta destinação a materiais recicláveis”, recorda.  

O professor fundou o Ama com um grupo de 30 alunos e decidiu  buscar apoio do poder público e das três cooperativas da cidade, que sempre tiveram um trabalho muito voltado para a valorização dos projetos locais. Trabalhando de forma intercooperativa, o projeto deu início a uma pequena revolução na cidade.

 Os jovens se engajaram e começaram a recolher materiais, antes ignorados, para reciclá-los.  A partir daí, as atividades evoluíram e o Ama conseguiu colocar em prática um projeto de sustentabilidade e recuperação ambiental, dando nova destinação a uma área na qual antes funcionava um lixão. O espaço foi revitalizado e transformado, em 2014, na Praça Ecológica Pedro de Souza Pinheiro, motivo de orgulho para a população.

Localizada em meio a  exuberantes exemplares de palmeiras, ipês, imbaúba e mogno do Pará, a praça é ornamentada por  500 pneus e mais de 10 mil garrafas pet recicladas. “Os alunos aprenderam que através da união promovida pelo cooperativismo, com o trabalho em equipe, é possível mudar a realidade. O cooperativismo nos ajudou a  resgatar valores como a determinação, o engajamento da comunidade e a importância do trabalho voluntário. Isso é algo firme e consistente na formação de cada um que passa pelo Ama”, ressaltou.

OUTROS ARES

Crédito: Lula Lopes

O projeto criado por Rocha e apoiado pelas três cooperativas da cidade fez mais do que transformar uma praça da cidade. Ele ajudou a mudar a mentalidade dos moradores que não tinham perspectiva de crescimento. Foi também do lixo, por meio de produtos recicláveis, que o Ama deu sentido às vidas de dezenas de adolescentes e jovens.

Expandindo o formato de atuação, Rocha, seus alunos e voluntários recolhem latinhas, garrafas pet e de vidro, dentre outros materiais, para comercializá-los. Com o valor arrecadado, são promovidas viagens, ações que enriquecem culturalmente os participantes e abrem portas para a visita a locais, antes, inimagináveis e inacessíveis para pessoas de baixa renda.

Nestes anos de projeto, já rodamos quatro regiões do País. O nosso objetivo, com isso, é proporcionar que os nossos alunos conheçam outras cidades através de seu próprio  trabalho e esforço”, comenta o professor. Vale destacar: desde o início do projeto, o grupo já visitou, dentre outras cidades, Rio de Janeiro, Fortaleza, Natal, Aracajú, Maceió e São Paulo.

Daniela Bezerra Costa, 15 anos, é uma das alunas voluntárias que fazem parte do Ama. No grupo desde agosto de 2018, ela garante que a motivação para participar veio do desejo  de ajudar o próximo “Depois que comecei a trabalhar com eles, me senti melhor. Saber que estou ajudando a alguém, fazendo doação, por menor que seja, me fez sentir melhor”.

Um pouco mais antigo no grupo, Luiz Gustavo Bezerra Pinheiro, 16 anos, faz parte do Ama há seis anos e viu a evolução da cidade, bem como dos moradores. Um dos voluntários da construção da praça, ele lembra que o apoio das cooperativas tem sido fundamental para os avanços da região.

Muitos falaram que não era possível que um lixão se transformasse em algo tão bonito, como a praça ecológica que temos hoje. Esse projeto foi criando pernas, ganhando apoiadores, somamos forças com as cooperativas, que nos ajudam sempre que precisamos”, comemora o garoto que, por meio do projeto, pode conhecer o mar em uma das viagens do grupo. “Foi uma viagem inesquecível. Sabíamos que éramos capazes de fazer, e fizemos”, completou.

O projeto social, com a ajuda das cooperativas, pretende ir mais longe, alçar voos maiores. Neste ano, a viagem será com destino à Argentina e à tríplice fronteira. Até o momento, 80% do passeio estão pagos, tudo com dinheiro arrecadado com a coleta de material reciclável.

De acordo com o professor Fabrício Rocha, uma das metas do projeto é levar os participantes à Europa. “Nossa meta é, em 20 anos, chegar a Paris, de avião. Essa é uma ponte que nos mostra o quanto a união, o cooperativismo e o trabalho voluntário são importantes para o desenvolvimento de todos”, concluiu o educador.

O Dia C é um compromisso das cooperativas brasileiras com a construção de um futuro mais justo e sustentável para todos. Durante um dia, elas realizam milhares de ações voluntárias em todo o país para demonstrar um pouco do que o cooperativismo faz, diariamente, para colaborar com o desenvolvimento de suas comunidades.


Impacto comprovado

Confira o Índice de Desenvolvimento Humano de Pedro Afonso em comparação à média brasileira e ao estado do Tocantins

IDHMIDHM RendaIDHM LongevidadeIDHM Educação
Brasil0,7270,7390,8160,637
Tocantins0, 6990,6900,7930,624
Pedro Afonso (TO)0,7320,6990,8460,664

Fonte: Atlas do Desenvolvimento Humano (Brasil – 2010)


Esta matéria foi escrita por Kelly Ikuma e está publicada na Edição 25 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


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