Inovação é ingrediente de gestão para cooperativa de energia renovável



Brasília (23/2/17) – A primeira cooperativa de energia renovável fotovoltaica do Brasil tem pouco mais de seis meses de funcionamento e seus cooperados já têm motivos de sobra para celebrar a realização de um sonho ousado. Localizada na cidade de Paragominas, no estado do Pará, a Cooperativa Brasileira de Energia Renovável (Coober) promete retornar o investimento inicial de seu quadro social em menos de seis anos. A informação é do advogado especialista em direito ambiental, Raphael Sampaio Vale, presidente da Coober.

Após percorrer diversos estados, apresentando a cooperativa que faz da inovação seu principal ingrediente de gestão, o advogado esteve em Brasília para participar de uma série de eventos e, durante sua passagem pela Casa do Cooperativismo, fez questão de contar um pouco da história da Coober que, antes de completar o primeiro aniversário, já planeja passos ainda mais ousados.

Confira na entrevista abaixo.

Como foi a sensibilização dos profissionais para aderirem à ideia de criar uma cooperativa?

Raphael Vale – Esse foi um trabalho intenso de formiguinha. Falávamos com os amigos mais próximos e muitos se mostravam receosos, outros negavam imediatamente, mas com os argumentos certos e muita persistência, obtivemos êxito. Acredito que a primeira reunião entre todos os cooperados tenha sido um marco, por foi o momento de um olhar pro outro, se conhecerem e se darem conta de que, como sócios de uma cooperativa, todos são responsáveis, com os mesmos direitos e deveres. Hoje, depois de um ano, somos 23 amigos que tornamos uma ideia incomum em realidade. Hoje somos a Coober, a primeira cooperativa de energia renovável do país. Sem dúvida, colocar a cooperativa em operação representou um corte significativo na história do setor elétrico brasileiro.

De onde surgiu a ideia de criar uma cooperativa com essa natureza?

Raphael Vale – Bom, não há como negar que o mundo iniciou um processo sem volta da onda da economia colaborativa. A realidade hoje da Coober é fruto de um trabalho colaborativo. Sem a atuação integrada de todos os cooperados não seria possível chegar onde chegamos. Para nós, da Coober, um modelo econômico que só contempla um lado, sem preocupar com os aspectos social e ambiental, está falido.

A ideia surgiu quando eu fazia um curso internacional que abordou um pouco da questão das mudanças climáticas. Eu percebi que, enquanto cidadão, eu precisava fazer a minha parte, sem esperar que as grandes corporações ou governos se movimentassem. Enquanto cidadão preocupado com o mundo, com a sustentabilidade, eu precisa me mexer, contribuir de alguma forma. E o jeito que encontrei para fazer isso era mudando a minha forma de pensar e agir.

Fui pesquisar e me deparei com a Alemanha, uma referência para o nosso projeto em Paragominas (no estado do Pará). Lá, existem 822 cooperativas de energia, sendo que mais de 700 são de energia renovável. Visitamos algumas delas para entender como funciona e observamos que, embora muito à frente do Brasil nesse campo, eles enfrentam as mesmas dificuldades que temos aqui, principalmente como estar integrado à rede de distribuição local.

E aí, quando a Aneel, em novembro de 2015, publicou a resolução permitindo que cooperativas, consórcios e condomínios gerassem energia, isso me chamou a atenção. E eu decidi iniciar o processo de constituição de uma cooperativa. Como eu já conhecia um pouco do movimento, pois minha mulher é de uma cooperativa de crédito, fui em busca de quem pudesse me apoiar. Encontrei a OCB/PA e tudo começou a virar realidade.

Quais as vantagens de se produzir energia renovável (solar fotovoltaica) na forma cooperativa?

Raphael Vale – Ah, são muitas! Poderia citar, por exemplo: menor valor investido, já que os custos são divididos por 23; mobilidade na produção, pois os cooperados podem mudar de endereço sem se preocupar com os equipamentos; desenvolvimento de uma cultura de colaboração; melhor escolha/avaliação das opções, mais pessoas pensando com o mesmo objetivo; melhor relação com a concessionária; e tratativas mais adequadas de benefícios e isenções fiscais.

A Coober é uma cooperativa que leva muito a sério o conceito de inovação. Poderia comentar?

Raphael Vale – A inovação é o que move o mundo. O ser humano, apesar de seus medos, quer sempre melhorar. Durante muito tempo, fomos forçados a crer que era preciso fazer mais do mesmo e do mesmo jeito. Inovar era feio ou desnecessário. O que seria do mundo se não fossem os inovadores, pessoas que pensam “fora da caixinha”? Imagine quantas pessoas disseram ser loucura ir à Lua, ou, mais recentemente à Marte? O que terá sido dito a quem pensou em inventar o um carro elétrico com grande autonomia? Eu vi um desses. Abri o capô e não há motor. Não tem cheiro. É um veículo que não polui. É limpo! Sem dúvida, a inovação é o grande combustível da Coober, que luta por uma democracia energética.

Para mim, a inovação passa pela superação do erro. A gente se esquece que para andarmos, caímos muito. Vivemos rígidos demais e isso nos trava de sermos a potência para a qual nascemos. E o cooperativismo tem se permitido ir além, buscando inovar, com mais intensidade. O cooperativismo vai crescer muito, porque todo brasileiro tem condições se estar vinculado a uma cooperativa. Todos podem ser cooperados.

A Coober é pioneira, empreendedora e inovadora. O que vem pela frente na história da Coober?

Raphael Vale – Nós já estamos estudando a operação de um biodigestor a partir de meados do segundo semestre. Ele será um gerador de energia à base da biodigestão de resíduos de gado, coletados nos frigoríficos da região. Temos muito trabalho pela frente, mas acreditamos que, ainda neste ano, teremos mais esta opção. Este poderá ser um grande salto, tão grande quanto o fotovoltaico. Além disso, temos pensando em adquirir um carro elétrico para mostrar que é possível não emitir CO2. Nós podemos ser mais inteligentes e impactar menos o meio ambiente!

E qual foi a contribuição da OCB e da OCB/PA para a realização deste ideal?

Raphael Vale – Sem a OCB e a OCB/PA, a Coober não seria possível. A OCB no estado do Pará recepcionou muito bem a ideia e já iniciamos as tratativas. Naquela época tive a oportunidade, também, de estabelecer um contato maior com a DGRV, a Agência de Cooperação da Alemanha. Nós encontramos todo o apoio necessário para criarmos a cooperativa. Até porque, sem a luta da OCB Nacional para a inclusão das cooperativas no normativo da Aneel, não teríamos a primeira cooperativa de energia renovável do país. Ou seja, a OCB e OCB/PA foram e são fundamentais para o pleno funcionamento da Coober.

Atualmente contamos com o apoio da OCB/PA para montarmos um plano de expansão. Como isso será feito, é o grande desafio. Não tenho dúvida de que em alguns anos, teremos um grande sistema com cooperativas de energia renovável em todos os estados brasileiros.

Quais os resultados práticos na vida dos cooperados?

Raphael Vale – A primeira coisa é que todos, agora, conhecem com profundidade o cooperativismo. No começo, alguns cooperados nem sabiam direito o que este movimento poderia fazer por eles. Hoje, todos nós sabemos muito bem que sem cooperação pouco poderíamos fazer em prol do nosso objetivo comum. Esse é um dos grandes ganhos.

Além disso, é importante destacar que a Coober é uma cooperativa de micro geração que não vende energia elétrica. Toda a produção é injetada na rede de transmissão da Companhia de Energia Elétrica do Pará e recebemos, depois disso, uma compensação na nossa fatura mensal. Em média, o percentual é de 70% do valor da conta. Então, o que já percebemos é que os nossos cooperados terão, em cerca de seis anos, o retorno do seu investimento. E, dependendo dos reajustes tarifários que possam surgir até lá, talvez este retorno ocorra em bem menos tempo.

Saiba mais sobre a Coober

Capacidade: 75 KWp
​Investimento inicial: R$ 600 mil​
Nº de placas fotovoltaicas: 288 unidades​
Produção média mensal: 11.550 KW/h
Número de cooperados: 23
Inauguração: 5/8/16​


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