Alysson Paolinelli fala sobre o agro e o futuro do setor

Belo Horizonte (21/9/21) – O ex-ministro Alysson Paolinelli, responsável pela revolução que possibilitou o cultivo nas áreas de cerrado e é o indicado ao Nobel da Paz deste ano, concedeu uma entrevista ao Sistema Ocemg e falou sobre cooperativismo, agricultura ao longo dos anos e a possibilidade de receber a premiação.

Mineiro de Bambuí, Paolinelli é graduado engenheiro agrônomo pela Universidade Federal de Lavras (UFLA), foi Secretário de Agricultura de Minas Gerais e Ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, no governo de Ernesto Geisel, quando modernizou a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e promoveu a ocupação econômica do cerrado brasileiro.

 

A agricultura tropical do Brasil e do mundo contou com sua contribuição para se tornar forte e viável. Qual foi sua motivação e como se deu a estruturação deste processo?

 

Durante muitos anos, a agricultura foi abastecida pela região temperada. Isso foi preocupação de alguns estadistas, como Thomas Malthus, que, no início do século passado, observou que a curva de crescimento da população era uma equação geométrica e a curva de oferta de alimentos era uma equação aritmética e que elas iriam se cruzar em algum momento, fazendo com que a população corresse riscos em termos de alimentação.

O mundo estava crescendo mais do que a possibilidade de oferta. E não havia tecnologia e conhecimento para cultivo nas regiões tropicais. Este era o cenário e tivemos que tomar a decisão de criar conhecimento próprio. Escolhemos o cerrado por ser uma terra que já foi relativamente fértil, mas o fogo, as chuvas torrenciais, o pisoteio de animais silvestres e domésticos foram o degradando.

A Embrapa estava recém-criada, a partir do exemplo de Minas, onde eu tinha criado o Pipaemg, que se transformou na Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig). Porém, após fundada, a Embrapa foi abandonada e quando fui indicado ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, ela passou a ter uma nova governança com autonomia administrativa e financeira.

Na época, foram feitos convênios com universidades, instituições estaduais de pesquisa e iniciativa privada, com isso, tivemos um boom integrado, usando toda a capacidade de inteligência disponível no Brasil. Autorizamos a Embrapa a contratar mil profissionais, abrimos concurso e tivemos uma decepção, porque só apareceram 52 jovens com pós-graduação. Então, criamos uma bolsa, classificamos os 950 que faltavam e possibilitamos que fossem para os melhores centros de ciência do mundo.

Ao mesmo tempo, por meio de convênios com os institutos de pesquisa estaduais, mandamos 462 pesquisadores para estes treinamentos e demos 100 bolsas nas universidades. Em pouco tempo, esse pessoal foi treinado, fortaleceu o grupo e o Brasil passou a ter a melhor instituição de pesquisas da região tropical mundial. Foi um esforço sem precedentes. Conseguiram, em tempo recorde, conquistar a fertilidade do cerrado. Essa foi a grande revolução feita no Brasil na década de 1970 até os dias atuais, embora, hoje, a falta de recursos para a Embrapa seja preocupante.

 

Como avalia a agricultura brasileira nos tempos atuais? Quais são os principais desafios do setor para se manter competitivo, produzindo com qualidade e quantidade para dentro e para fora do país?

 

O Brasil passa, infelizmente, por uma situação triste fora do setor agrícola. No agro, nos tornamos os mais competentes, competitivos, ganhamos a concorrência e produzimos os melhores alimentos disponíveis, mais baratos e com constância de oferta. E o Brasil produz ao longo dos 12 meses, fazendo três a quatro lavouras ao mesmo tempo.

Com isso, nos tornamos o maior exportador de alimentos do mundo. É o que está salvando a economia brasileira, mas, por outro lado, estamos preocupados porque não podemos parar e nem perder essa capacidade produtiva. É preciso criar um movimento para mostrar que a pesquisa é a forma de manter o desenvolvimento competitivo.

Agora, principalmente, depois da pandemia, o mundo sabe que precisa de alimentos mais saudáveis e nutritivos. Espero que a juventude que vem, viu nosso exemplo e sabe que o caminho do trabalho, da tecnologia, dê prosseguimento.

 

Como as cooperativas contribuem para a produção no campo? Onde elas podem crescer para seguir dando suporte para os produtores rurais?

 

Devem continuar fazendo o que elas fazem e ampliar ainda mais sua atuação. O cooperativismo é a forma de você dar mais distribuição e oportunidades, mais competência ao pequeno. Ele unido e organizado tem muito mais vantagens do que sozinho.

 

O senhor poderá ser o primeiro brasileiro a ser reconhecido com o Nobel da Paz. Qual é a importância de representar o setor agro e a produção de alimentos em uma das principais premiações do mundo?

 

Para o Brasil será muito importante. Será o resultado da Revolução Verde, que criou a primeira agricultura tropical do mundo e que vai garantir a segurança alimentar daqui por diante. Acho que o Brasil merece esse reconhecimento. Quando meus companheiros resolveram me colocar como candidato, mostrei a eles as dificuldades, mas fiquei muito honrado, porque, de fato, o país precisa ter um arauto para dizer: nós fizemos uma tarefa que vai mudar o mundo.

 

(Fonte: Sistema Ocemg)

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